Foto acima: Tomando sopa, dentro de uma cabana de “totora” em uma das ilhas flutuantes dos Uros no lado peruano do lago Titicaca; no pulso direito, meu último relógio, que, inclusive, presenteei um dos nativos.
Sou um buscador, um guerreiro do coração e gosto muito de algumas frases de autores conhecidos. Todos eles falam sobre busca, renascimento, novo e velho, vida e morte; falam da necessidade que nós seres humanos temos de nos renovarmos a cada dia, a cada momento, a cada instante. Afinal de contas, vida é movimento.
Tem três comentários, um do escritor lusitano José Saramago, outra do também poeta português Fernando Pessoa, e o última do nosso navegador solitário que gostaria de repassar neste momento.
Diz Fernando Pessoa: “Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já tem a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares”. Para ele, esse é o tempo da travessia. Contudo, lembra Fernando pessoa, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos.
Todos nós sabemos quando é exatamente este momento, pois nosso espírito já se foi e nosso corpo e mente insistem em ficar na mesmice do nosso pensamento normótica. Não tem jeito, mais dia menos dias, o previsto acontece e todos se unem (corpo, mente e espírito) numa bonita jornada rumo a si mesmo.
O navegador solitário, Amyr Klink, fala da sua experiência de forma clara e instigante. Para ele, um homem precisa viajar, mas viajar por sua conta, não por meio de histórias, imagens, livros ou TV. Precisa viajar por si, com seus olhos e pés, para entender o que é seu. Para um dia plantar as suas próprias árvores e dar-lhes valor. Conhecer o frio para desfrutar o calor. E o oposto. Sentir a distância e o desabrigo para estar bem sob o próprio teto. Klink defende que um homem precisa viajar para lugares que não conhece para quebrar essa arrogância que nos faz ver o mundo como o imaginamos, e não simplesmente como é ou pode ser. Que nos faz professores e doutores do que não vimos, quando deveríamos ser alunos, e simplesmente ir ver.
E quando ele fala que um homem precisa viajar, quer dizer que os seres humanos necessitam disso; fala do ser como espécie, não como gênero, sexo. Esta viagem é longa, as vezes alegre, as vezes triste, mas vale a pena. E, na visão de José Saramago, a viagem não acaba nunca. Para ele, “só os viajantes acabam. E mesmo estes podem prolongar-se em memória, em lembrança, em narrativa. Quando o visitante sentou na areia da praia e disse: ‘Não há mais o que ver’, sabia que não era assim.
“O fim de uma viagem é apenas o começo de outra”, pondera o escritor português, que aponta algumas necessidades: “É preciso ver o que não foi visto, ver outra vez o que se viu já, ver na primavera o que se vira no verão, ver de dia o que se viu de noite, com o sol onde primeiramente a chuva caía, ver a seara verde, o fruto maduro, a pedra que mudou de lugar, a sombra que aqui não estava. É preciso voltar aos passos que foram dados, para repetir e para traçar caminhos novos ao lado deles. É preciso recomeçar a viagem. Sempre.”
Diante disso, o que mais há de se dizer senão “buen caminho”.
Mhanoel Mendes, um buscador. www.oikos.org.br e www.obuscador.org