A Verdadeira Mística do Sexo


por Mani Álvarezmani@clasi.org.br

A sexualidade, sendo uma função natural que foi reprimida em nossa cultura, deu origem à neurose, às perversões e muitos outros distúrbios relacionados ao sexo. Mesmo a sua liberação, nos últimos tempos, vem acompanhada de sentimentos de culpa e outras distorções sérias, demonstrando que ainda não sabemos verdadeiramente vivenciar o sexo em nossas vidas.

Mas, depois da descoberta, por arqueólogos, de uma outra forma de lidar com o sexo — tal como era praticada por uma certa tradição hindu — a sexualidade passou a ser vista com outros olhos, como um processo iniciático de elevação e expansão da consciência. Alguns estudiosos do assunto descobriram que, em época anterior à invasão e dominação de uma vasta região da Europa, Oriente Médio e India pelos arianos e semitas, havia uma civilização nativa indo-européia estabelecida a partir de valores completamente diferentes daqueles que nos são habituais hoje. O sexo era um deles.

Sabemos que o Tantra é um sistema de tradições multimilenárias, anteriores à cultura védica dos povos arianos. Era voltado para o culto aos valores femininos e adoradores da Grande Mãe. Para essa cultura, cujos indícios foram desenterrados junto a grandes cidades de mais de 10 mil anos aC., como Harapa, Mohenjo-Daro, Lothal, Ankara, Chatal-Huyuk, Khajuraho, etc, o sexo era uma forma natural utilizada para fins religiosos, cujo ápice era tornar manifestada a vida. Diferentemente de nossa concepção moderna de liberação sexual, onde se confunde promiscuidade, alívio e descarga de tensões, pornografia, compulsão, estímulos eróticos e hormonais, autoafirmação, em atos que realizam uma caricatura do verdadeiro ato sexual, nossos antepassados tântricos consideravam o sexo como um caminho sagrado, uma forma de transcendência mística, que proporcionava uma iniciação ao Ser através do amor.

A tradição tântrica buscava — e o sexo era um dos métodos -o mesmo que buscamos hoje através de psicoterapias, meditação e exercícios psicovivenciais, ou seja: a liberação do ego, a transcendência do espaço-tempo, a experiência da unidade com o Todo, a capacidade de entrega ao amor. Para eles, o sexo não deve jamais ser reprimido ou censurado, mas vivido com entrega e alegria, pois é um caminho para Deus. Por isto não deve causar estranheza o fato de existirem tantos símbolos fálicos esculpidos em pedras e rochas em sítios pré-históricos. O linga era a representação do órgão sexual masculino, quase sempre esculpido sobre um suporte em forma de cálice, que representava a Yoni, ou símbolo sexual feminino. Quando não havia um suporte, o linga era erguido diretamente do chão, pois a yoni era a própria terra.

Por isso cultuavam deidades femininas, porque viam na Shakti (natureza) a força criadora da vida. Um aspecto intrigante para a mente moderna é o lado terrível, monstruoso e assustador das deusas. Elas exigem sacrifícios e, às vezes, devoram os próprios filhos. Como a mãe natureza que doa e toma a vida, num ciclo eterno de morte-renascimento, eles representavam suas deusas com as mesmas características de fatalidade do destino humano.

Alguns Sutras Sagrados encontrados em escavações falam de um método para se desenvolver e praticar o Tantra. Osho, o místico hindu que trouxe ao ocidente os ensinamentos tântricos, ensina que deve haver contenção do orgasmo físico, pois ele implica em perda de energia e transforma o “fogo em brasa”. Aos homens, ele diz que deve haver um treino para inibir a ejaculação, e às mulheres, um treino das contrações vaginais e um exercício para a entrega total e absoluta ao sentir. Osho afirma que a entrega é fundamental, não só às sensações sexuais, mas a todas as outras, como sentir a comida, degustar o sabor, sentir a pele ao contato da terra, do vento, da água, estimular a percepção de cheiros e aromas, porque tudo isso nos ensina a viver o agora, o momento presente – que é o único que existe! Passado e futuro são abstrações da mente e não têm existência. Só o presente existe. E para vivê-lo é preciso treinar os órgãos sensoriais.

Em seguida, Osho ressalta que o sexo existe para ser transformado em amor e transcendido. O objetivo último é a transcendência, inclusive do sexo. Uma demonstração disso é sua afirmação de que, depois que uma pessoa vivencia a união cósmica (através do ato sexual com um parceiro), pode-se prescindir da relação sexual, porque a pessoa é capaz de, sozinha, despertar em si mesma a transformação e a transcendência.

Por último, para fins didáticos, há a Geometria Tântrica, que exemplifica como se dá a união alquímica do amor. Enquanto prevalecer a divisão do sexo entre corpo e mente, os parceiros serão quatro — e estarão formando um quadrado! Não há encontro, não há comunhão, porque existem, na verdade, dois corpos e duas cabeças funcionando. O ser está fragmentado e dividido e isto impossibilita a entrega.

Mas, existem encontros que se assemelham a triângulos. Por um momento repentino ocorre uma unificação interna dos dois parceiros e estes vivenciam a Unidade. Um se torna o Outro, e nesta fusão eles experimentam o Absoluto, a dissolução do ego, a dissipação do tempo e do espaço, o amor tântrico. Dura um segundo, mas é uma antecipação daquilo que os místicos de todas as tradições testemunham em seus relatos de um orgasmo cósmico, como Tereza D’Ávila e João da Cruz.

Finalmente, o encontro verdadeiramente tântrico se dá quando o casal vivencia o círculo. Não existem ângulos, não existe tempo, não existe ego. Mas isto só pode acontecer quando o homem aprende a reter a ejaculação e a mulher a se entregar verdadeiramente. Osho insiste no fato de que deve haver amor na relação, pois se não houver, ambos sentirão pressa e não haverá entrega. Um estará usando o outro e exigirá cada vez mais estímulos para que o ato se conclua com uma descarga fisiológica de prazer, e nada mais.

Temos muito a aprender com os sábios ancestrais sobre amor e sexo! A liberação sexual dos anos 80 parece piada quando compreendemos realmente o que está em jogo, no ato sexual.

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